A POLIPNEIA NAS AVES

Referência: Souza Junior, A. B., Moraes, I. A. A polipneia nas aves. Webvideoquest de Fisiologia Veterinária. 2016.

 

As aves quando em estresse térmico procuram maneiras de perder calor e diminuir sua produção de calor, isso pode ser realizado alterando o fluxo de sangue para a superfície corporal, ou alterando a taxa de evaporação da água pela pele e pelo trato respiratório.
Não dispondo glândulas sudoríparas, a regulação da temperatura corporal por meio do aumento da frequência respiratória com a boca aberta, chamada de polipneia, é considerada o mais importante processo de termorregulação das aves quando estão gravemente estressadas pelo calor (RICHARDS, 1970a; ROBERTSHAW, 2006).
As aves possuem uma grossa proteção que age como isolante térmico composta pelas penas, que se encontram na maior parte de sua superfície corporal (RICHARDS, 1970a). A atividade vasomotora na pele abaixo das penas é mínima (KALLIR, 1930; IRVING e KROG, 1955) enquanto em áreas que não possuem penas como as pernas apresentam maior atividade vasomotora e maior ação de seu papel termorregulatório (SCHOLANDER et al, 1950) o mesmo ocorre na crista, que é altamente vascularizada (WILSON e PLAISTER, 1951; HONMA et al., 1966).
A evaporação a partir do trato respiratório visando a termorregulação é comumente percebida nas aves domésticas e é popularmente conhecida como arquejo. Infelizmente não há um termo universal e preciso para esse mecanismo, podendo ser chamado de polipnéia termorregulatória, taquipnéia induzida por calor ou hiperpnéia termicamente induzida (WHITTOW, 1966).
Apesar de ser um mecanismo comum nas aves, este não é universal, o pintarroxo de cassin ( Carpodacus cassinii ), por exemplo, não é capaz de ofegar e sua única resposta ao estresse térmico é a diminuição de sua produção de calor (RICHARDS, 1970a).
Os valores, em temperatura, que definem o estresse térmico variam de acordo com a espécie, no caso do lagópode de cauda branca ( Lagopus leucurus ) o ofego é iniciado em temperatura de apenas 21ºC (JOHNSON, 1968).
Nas aves o ofego é um mecanismo dissipador de calor que não prejudica o voo (RICHARDS, 1970a).
Algumas aves conseguem se adaptar à exposição em altas temperaturas e manter sua temperatura corporal por meio do aumento da evaporação de água através do ofego, similar ao que ocorre nos cães. Essas aves conseguem aumentar sua frequência respiratória em até 20 vezes, tal estratégia poderia resultar em uma severa alcalose, porém isso não ocorre graças à anatomia do sistema respiratório das aves, que se comunica com os sacos aéreos (WILLIAM et al, 1966), esse mecanismo também foi relatado em avestruzes (JONES, 1982). Animais como o pombo ( Columba livia ), o avestruz e o papa-léguas ( Geococcyx californianus ) conseguem suportar temperaturas de até 51ºC sem apresentar grandes aumentos na temperatura corporal (RICHARDS, 1970b).
Na respiração das aves, o ar pode seguir por dois caminhos diferentes: através do mesobrônquio ou através do parabrônquio (SALT e ZEUTHEN, 1960), também conhecidos como brônquios terciários (REECE, 1988), foi sugerido que essa conformação anatômica permite que o ar passe pelos sacos aéreos sem passar pela superfície pulmonar, evitando assim a troca de gás e uma consequente alcalose respiratória (WILLIAM et al, 1966), já no avestruz foi relatado que ocorre diminuição e desvio da ventilação no parabrônquio (JONES et al, 1983).
Na maioria das espécies aviárias, existem dois grupos de parabrônquios, conhecidos como parabrônquios paleopulmonares parabrônquios neopulmonares . Esse último é caudal ao anterior e está imediatamente cranial aos sacos aéreos caudais (REECE, 1988). A parede dos parabrônquios é constituída de musculatura lisa, com inervação extrínseca colinérgica (nervo vago), e pode regular a chegada de ar aos capilares aéreos através do controle do diâmetro dos parabrônquios (MACARI e GIVISIEZ , 2002). Os sacos aéreos são sacos seromucosos tidos como continuações dos brônquios secundários. Suas paredes são delgadas e tem parco suprimento sanguíneo (REECE, 1988). Existem ao todo 9 sacos aéreos nos frangos de corte (MACARI e GIVISIEZ , 2002).
Os sacos aéreos permitem a ventilação superficial e rápida, que auxilia a eliminação de calor pela ave (ofegação), sem que haja um comprometimento do equilíbrio ácido-básico porque não ocorre troca gasosa do ar que é ventilado superficialmente (MACARI e GIVISIEZ , 2002). Já Menum e Richards (1975) afirmam que o principal local de perda de calor durante a polipneia respiratória é o trato respiratório superior e que os sacos aéreos possuem pouca importância nesse processo
Em um estudo com galos da raça White Leghorn ( Gallus gallus domesticus ) foi constatado que durante a polipnéia termorregulatória uma frequência respiratória máxima de 201-304 respirações/minuto. Neste estudo foi observado que o início da polipnéia respiratória se deu quando a temperatura do sangue arterial era de 41,5ºC, a temperatura da superfície da crista de 40,9ºC e a temperatura da pele embaixo das penas de 40,9ºC. O pico de frequência respiratória se dava quando a temperatura do sangue arterial atingia 43,1ºC, a temperatura da superfície da crista 43ºC, e a temperatura da pele embaixo das penas 42,4ºC (WOODS e WHITTOW, 1974). Os autores consideraram a temperatura do sangue arterial (oriundo da aorta) como um bom referencial par a medida da temperatura corporal das aves pois esta responde rapidamente às mudanças de temperatura.

 

CONTROLE DA POLIPNEIA DAS AVES
A polipnéia termorregulatória foi descrita em uma grande variedade de aves selvagens e domésticas (BLIGH, 1966), nesses animais o hipotálamo anterior e a área pré-óptica são regiões importantes na coordenação da polipnéia (MAGOUN et al, 1938; ANDERSSON et al, 1956; AKERMAN et al, 1960). De acordo com Macari e Givisiez (2002 ) a polipneia termorregulatória da aves parece ser controlada no tálamo, envolvendo ainda ramos aferentes do vago e receptores centrais e periféricos (MACARI e GIVISIEZ , 2002).
Embora tenha sido reportado que um aumento na temperatura retal é necessário para que a polipneia termorregulatória tenha início, a inibição da polipneia termorregulatória, uma vez iniciada, pode ser alcançada por meio apenas da diminuição da temperatura da pele, sem necessidade da diminuição da temperatura retal, o que sugere que há de fato um componente periférico na regulação do ofego (RICHARDS, 1970b).
Esse fator leva à conclusão de que o gatilho de início da polipneia termorregulatória está ligado à um aumento da temperatura hipotalâmica, mas o controle desse mecanismo está ligado à um fator periférico (pele), central e extra cranial (retal) (WOODS e WHITTOW, 1974).

 

A TREMULACAO
As aves por não possuírem glândulas sudoríparas, utilizam-se de outro mecanismo para o aumento da evaporação (além da polipneia) denominado tremulação ou vibração gular , que consiste na rápida oscilação do assoalho da cavidade oral, da parte superior da garganta e do osso hioide. O ar é movimentado para dentro e para fora do trato respiratório para umidificá-lo (ANDERSON, 1988; RICHARDS, 1970).

 

Referências bibliográficas:
  1. AKERMAN, B., ANDERSSON, B., FABRICIUS, E., SVENSSON, L. Observations on central regulation of body temperature and of food and water intake in the pigeon ( Columba livia ). Acta physiology scand. 50. p. 328-336. 1960.
  2. ANDERSON, B. E. Regulação da Temperatura e Fisiologia Ambiental.   In: SWENSON, M. J. (Ed.).   Dukes – Fisiologia dos Animais Domésticos . Rio de Janeiro: Editora Guanabara. p. 623-629. 1988.
  3. ANDERSSON, B., GRANT, R., LARSSON, S. Central controlo f heat loss mechanisms in the goat. Acta physiology scand. 37. p. 261-280. 1956.
  4. BLIGH, J. The thermosensitivity of the hypothalamus and thermoregulation in mammals. Biology review 41. p. 317-367. 1966.
  5. HONMA, K., KIMURA, K. HARADA, E., SEKINE, K. The large fluctuations of skin temperature at constant ambient temperature in human, rabbits and fowl. Z. Biology 115. p. 287-299. 1966.
  6. IRVING, L., KROG, J. Skin temperature in the arctic as a regulator of heat. Journal Appl. Physiology 7. p. 354-363. 1955.
  7. JOHNSON, R. E. Temperature regulation in the White-tailed ptarmigan Lagopus leucurus. Comp. Biochemical Physiology 24. p. 1003. 1968.
  8. JONES, J. H. Pulmonary blood flow distribution in panting ostriches. Journal Appl Physiol Respirat Environ. 53(6): 1411-7. 1982.
  9. JONES, J. H., GRUBB, B. SCHMIDT-NIELSEN, K. Panting in the emu causes arterial hypoxemia. Respir Physiol. 54(2):189-95. 1983.
  10. KALLIR, E. Temperaturtopographic einiger vogel. Experimentelle Untersuchungen. Z. Vergl. Physiology 13. p. 231-248. 1930.
  11. MACARI, M., GIVISIEZ, P. E. Fisiologia respiratória. In: MACARI, M. Fisiologia aviária aplicada a frangos de corte. Jaboticabal: FUNEP/UNESP. p. 38-49. 2002.
  12. MAGOUN, H. W., HARRISON, F., BROBECK, J. R., RANSON, S. W. Activation of heat loss mechanisms by local heating of the brain. Journal Neurophysiology 1. p. 101-114. 1938.
  13. MENUAM, B., RICHARDS, S. A. Observations on the sites of respiratory evaporation in the fowl during thermal panting. Respiration Physiology. Vol.25. Issue 1. p. 39-52. 1975.
  14. REECE, W. O. Respiração nos Mamíferos. In: SWENSON, M. J. (Ed.).   Dukes – Fisiologia dos Animais Domésticos . Rio de Janeiro: Editora Guanabara. p. 229-242. 1988.
  15. RICHARDS, S. A. The biology and comparative physiology of thermal panting. Biological Reviews 45. p. 223-261. 1970a.
  16. RICHARDS, S. A. The significance of changes in the temperature of the skin and body core of the chicken in the regulation of heat loss. Journal Physiology 216. p. 1-10. 1970b.
  17. ROBERTSHAW, D. Regulação da Temperatura e o Ambiente Térmico. In: REECE, W. O. (Ed.).   Dukes – Fisiologia dos Animais Domésticos . Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan. p. 897-908. 2006.
  18. SALT, G. W., ZEUTHEN, E. Biology and comparative physiology of birds. Academic press vol.1 , p. 363. 1960.
  19. SCHOLANDER, P. F., WALTERS, V., HOCK, R., IRVING, L. Body insulation of some arctic and tropical mammals and birds. Biology Bull. Mar. Bio. Lab. Woods Hole 99. p. 225-236. 1950.
  20. WHITTOW, G. C. Terminology of thermoregulation. Physiologist 9. p. 358. 1966.
  21. WILLIAM, A., CALDER, JR., SCHMIDT-NIELSEN, K. Evaporative cooling and respiratory alkalosis in the pigeon. Communicated, Duke University.p. 750. 1966.
  22. WILSON, W. O., PLAISTER, T. H. Skin and feather temperatures of hens kept at constant environmental conditions. Am. Journal Physiology 166. p. 572-577. 1951.
  23. WOODS, J. J., WHITTOW, G. C. The role of central and peripheral temperature changes in the regulation of termal polypnea in the chicken. Life Sciences 14. p. 199-206. 1974.
Skip to content