GLÂNDULA MAMÁRIA: a ejeção, a composição do leite e colostro e o ciclo da lactação
Referência: NARDES, A.P.P.; MORAES, I. A. Glândula Mamária: a ejeção, a composição do leite e colostro e o ciclo da lactação,. Webvideoquest de Fisiologia Veterinária. 2019
A EJEÇÃO DO LEITE
A ejeção ou descida do leite é o processo pelo qual ocorre a transferência do leite dos alvéolos e ductos finos para os grandes ductos e cisternas (PRESTES & LANDIM-ALVARENGA, 2017).
De acordo com Moraes (2016) a ocitocina é o hormônio requerido para a retirada do leite, enquanto diversos outros hormônios são essenciais para a manutenção de intensa síntese e secreção do leite.
Para uma eficiente retirada do leite, é necessário liberação da ocitocina que causa a contração das células musculares que envolvem os alvéolos (células miopiteliais) e o movimento do leite para dentro dos ductos e cisternas. Isso porque as células mioepiteliais são responsivas ocitocina e contraem-se quando expostas ao hormônio. A síntese e liberação da ocitocina pela hipófise posterior (neurohipófise) são estimuladas por reflexo neuroendócrino que envolve a estimulação tátil do úbere pela amamentação ou a estimulação manual durante a higienização do úbere antes da ordenha. Além disso, estímulos visuais, olfativos e auditivos, que ocorrem próximo ou dentro de canis, gatis ou sala de ordenha iniciam a liberação de ocitocina (KLEIN, 2014).
A estimulação mecânica das tetas através da ordenha ou pela amamentação, inicia o reflexo neural que se propaga através de medula espinhal até os núcleos paraventricular e supraóptico do hipotálamo que serão responsáveis por sintetizar a ocitocina e liberá-las dos terminais nervosos que passam sobre a eminência mediana (KLEIN, 2014).
Outra forma de estímulo a liberação de ocitocina, segundo Jutkowitz (2005) ocorre à medida que os fetos são forçados para o canal de parto, uma vez que os mesmo provocam a estimulação de mecanorreceptores no trato reprodutivo materno, que leva a um aumento da liberação hipofisária de ocitocina (DA COSTA, 2012).
Fonte: Cunningham tratado de fisiologia veterinária, Capítulo 39: A Glândula Mamária| Bradley G. Klein, PhD
A liberação de oxitocina ocorre segundos após a chegada do estímulo ao hipotálamo; a pressão aumentada dentro da glândula mamária torna-se evidente dentro de um minuto após a estimulação à medida que o leite é forçado para fora dos alvéolos e ductos por contrações das células mioepiteliais. A liberação de ocitocina dura apenas alguns minutos e a pressão aumentada é evidente em um minuto após o estímulo (KLEIN, 2014).
Vale, ainda, ressaltar que o reflexo de ejeção do leite é inibido por vários estímulos estressantes. Uma vez que o estresse aumenta a descarga de adrenalina e noradrenalina, que causam a contração dos músculos lisos e dessa forma obstruem os ductos mamários e vasos sanguíneos, evitando que a ocitocina atinja as células mioepiteliais. A adrenalina também pode bloquear a ligação da ocitocina as células mioepiteliais (MORAES, 2016).
A COMPOSIÇÃO DO LEITE
Segundo Moyes e Schulte (2010) quando o colostro é exaurido pelo filhote, a glândula mamária produz um leite que é mais rico em lipídeos e carboidratos. Os lipídeos fornecem energia e precursores biossintéticos. Os carboidratos do leite são principalmente a lactose, mas há também oligossacarídeos mais complexos. Os carboidratos servem como fontes de energia prontamente catabolizada pelos tecidos dos filhotes, além disso, os carboidratos são importante precursores biossintéticos (particularmente os oligossacarídeos mais complexos como aminocarboidratos) que são importantes para os glicolipídeos e as glicoproteínas da membrana. O leite também possuí proteína em abundância, principalmente a caseína, a qual serve como importante fonte de aminoácidos para a biossíntese. Esta proteína está altamente fosforilada permitindo a ligação de Ca2+ (quase 90% do Ca2+ na dieta dos filhotes estão presos dentro da estrutura das partículas de caseína).
Quantidade de componentes selecionados do colostro bovino como percentagem do nível no leite normal:
Fonte: De Jacobson NL, McGilland AD: The mammary gland and lactation. In Swenson MJ, editor: Dukes’ physiology of domestic animals, ed 10, Ithaca, NY, 1984, Cornell University Press.-Cunningham tratado de fisiologia veterinária, Capítulo 39: A Glândula Mamária| Bradley G. Klein, PhD
A lactose é composta por glicose e galactose e configura o principal carboidrato da maioria dos mamíferos. Os animais devem apresentar a enzima lactase no jejuno a fim de clivar a lactose (em glicose e galactose) e permitir sua utilização pelos mesmos. Na ausência dessa enzima, a lactose no intestino apresentará efeito osmótico, levando a diarreia. Tal enzima está presente na maioria dos neonatos mamíferos, mas às vezes está ausente nos animais adultos (KLEIN, 2014).
A gordura do leite é composta por um grande número de lipídios, incluindo os monoglicerídeos, diglicerídeos, triglicerídeos, ácidos graxos livres, fosfolipídios e esteroides. Os triglicerídeos são os componentes principais da gordura do leite (KLEIN, 2014).
Ainda de acordo com Klein (2014), a quantidade de gordura produzida varia muito tanto dentro quanto entre as espécies. O leite de mamíferos marinhos possui uma grande quantidade de gordura, com valores em torno de 40% a 50% em focas, 40% em golfinhos e 30% em baleias. Nessas espécies, a grande quantidade de energia no leite através da gordura auxilia a compensar a perda de calor pelo neonato. Já os animais domésticos, ovinos, suínos, caninos e felinos apresentam um leite com uma quantidade de gordura que varia de 7% a 10%. A vaca leiteira apresenta valores que variam de 3,5% a 5,5%; as cabras são semelhantes Às vacas (3,5%) e as éguas possuem valores menores (1,6%).
As principais proteínas do leite são as caseínas (α , β, e κ-caseína). Elas apresentam origem da união dos aminoácidos provenientes do sangue pelas células secretoras da glândula mamária. Além delas, outras proteínas podem ser encontradas no leite, entre elas a, já mencionada, α-lactoalbumina e a betalactoglobulinas (produzidas na glândula mamária); a albumina sérica, produzida pelo fígado e também as imunoglobulinas, produzidas pelos linfócitos (MORAES, 2016).
Cálcio, fósforo, potássio, cloro, sódio e magnésio são minerais primários do leite. As concentrações de lactose, sódio e potássio normalmente são constantes no leite, e juntamente ao cloro, determinam o equilíbrio osmótico do mesmo. A secreção de lactose, potássio, sódio e cloro para o leite determina o volume a ser produzido. Já as vitaminas não podem ser sintetizadas pela glândula mamária, sendo, então, sintetizadas pelas bactérias do rúmen, convertidas de precursores no fígado, no intestino delgado e na pele ou derivadas diretamente das fontes alimentares (MORAES, 2016).
A COMPOSIÇÃO DO COLOSTRO
As secreções da glândula mamária são fontes de água, sais e nutrientes para o filhotes mas a composição do leite muda com o tempo (MOYES & SCHULTE, 2010).
Inicialmente, a secreção é o colostro, que é rico em gordura, proteínas e imunoglobulinas, e pobre em lactose. Mais ou menos no quarto dia de lactação (em bovinos) a composição da secreção muda de colostro para leite normal (PRESTES & LANDIM-ALVARENGA, 2017).
O colostro é o leite produzido antes do parto, ou seja, sua formação ocorre na ausência da retirada do leite, no entanto a lactação não pode ocorre completamente até o fim da gestação, devido aos efeitos inibitórios da progesterona e do estrogênio sobre a secreção do leite (KLEIN, 2014).
O colostro é rico em agentes imunoprotetores, fatores de crescimento, minerais e vitaminas A e D. Ele também apresenta um inibidor de tripsina que protege as proteínas vitais do colostro da digestão no aparelho gastrointestinal do filhote. Neste ponto do desenvolvimento, o aparelho gastrintestinal do filhote é capaz de transportar anticorpos intactos, transferindo-os para sua própria circulação (MOYES & SCHULTE, 2010).
Dessa maneira, além da nutrição, o colostro tem uma importante função na imunidade passiva, contra os agentes infecciosos. As imunoglobulinas (p. ex., imunoglobulina A, ou IgA) são produzidas na glândula mamária pelos plasmócitos (derivados dos linfócitos B originados no intestino) como resultado da exposição da mãe a certos micro-organismos. Sendo assim, como tais imunoglobulinas estão em altas concentrações no colostro, o neonato pode receber imunidade passiva contra patógenos adquiridos pela mãe (KLEIN, 2014).
A transferência de vitamina A é de suma importância, uma vez que bezerros e leitões são particularmente deficiente ao nascimento devido a característica da placenta destas espécies. Os lipídios e as proteínas, incluindo as caseínas e as albuminas, também estão presentes em concentrações relativamente elevadas no colostro. A ausência de lactose deve-se ao efeito inibitório da progesterona sobre a formação da α-lactoalbumina, uma proteína do leite que compõem a enzima lactose sintetase, responsável por formar a lactose. A prolactina por outro lado é estimuladora da formação de lactose sintetase (KLEIN, 2014).
A ingestão do colostro é importante para o bem-estar dos neonatos de todas as espécies domésticas pois os mesmos recebem uma proteção imediata contra os organismos ambientais (KLEIN, 2014)
A absorção dos anticorpos através do leite, nas espécies domésticas, contrasta com a situação que ocorre em outras espécies (KLEIN, 2014). Nos ruminantes, suínos e equinos, a placenta é impermeável às imunoglobulinas, por isso, nestas espécies animais não há possibilidade de transferência de imunidade durante a gestação; esta só será possível, pela ingestão de colostro. Já nos carnívoros há transmissão passiva de imunoglobulinas através da placenta durante a gestação, dessa maneira, estes animais já têm certa imunidade ao nascer, que será reforçada pela ingestão de colostro (PRESTES & LANDIM-ALVARENGA, 2017).
É importante ressaltar que os neonatos geralmente apresentam um período limitado de 24 a 36 horas no qual as imunoglobulinas (proteínas) podem ser absorvidas através do intestino. Sendo assim, é essencial que a ingestão do colostro aconteça durante este período para assegurar a presença das imunoglobulinas no recém-nascido. Além disso, outros fatores antimicrobianos encontrados no leite como as lisozimas, lactoferrina e o sistema das lactoperoxidases, são significativos para a proteção contra o desenvolvimento de uma flora bacteriana entérica patogênica (KLEIN, 2014).
O CICLO DA LACTAÇÃO
Durante as primeiras 3 a 4 semanas de lactação a produção do leite tende a aumentar e depois vai diminuindo lentamente até o final da lactação. Após 305 dias de período lactacional as vacas são normalmente “secas”; os quilos de leite e a taxa de matéria gorda são calculados nessas bases. As vacas leiteiras são forçadas a interromper a lactação para se prepararem para a próxima lactação, para tal, o procedimento mais comum é interromper a ordenha. Dessa maneira, a pressão retrógrada dentro do alvéolo causada pelo leite inibe gradualmente a secreção do leite pelas células epiteliais alveolares, com resultante há a regressão das células alveolares e dos ductos menores. Vale ressaltar, ainda, que o processo de involução das glândulas mamária, geralmente requer pelo menos 1 mês. O sistema secretor (alvéolos) e o excretor (ductos) regridem e são novamente substituídos em 1 a 2 meses. Um período de 6 semanas é o que normalmente se deseja como intervalo mínimo entre a secagem e o início da próxima lactação (KLEIN, 2014).
DA COSTA, T. I. R. Urgência reprodutivas na cadela. 2010. 101f. Dissertação (Mestrado Integrado em Medicina Veterinária – Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa, Lisboa, 2010.
KLEIN, B. G. Cunningham tratado de fisiologia veterinária. 5. ed. Rio De Janeiro: Editora Elsevier, 2014.
MOYES, C.D; SCHULTE, P.M. Princípios de Fisiologia Animal. 2. Ed. Porto Alegre: Editora Artmed, 2010.
PRESTES, N.C.; LANDIM-ALVARENGA, F.C. Obstetrícia Veterinária. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.
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